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De lamparina acesa, abriu lentamente a porta dos seus aposentos, saiu e
para não fazer barulho decidiu deixa-la só encostada seguindo pelo longo
e lúgubre corredor.
Ao fundo, virou à direita, passou pela
cozinha enorme reparando que as brasas utilizadas para preparar o jantar
ainda emitiam um ténue calor, subiu as escadas de serviço ao
refeitório, passou pela direita das duas compridas mesas e utilizou a
passagem que dava acesso à capela pelas traseiras do altar (assim não
tinha de sair à rua), o corredor era estreito e sem janelas, mas
conhecia bem o espaço.
Chegada à porta que dava acesso à capela,
destrancou o ferrolho e abriu a porta lentamente sem emitir quaisquer
sons, sorrindo ao perceber que o azeite utilizado nas dobradiças horas
antes, resultava!
Rapidamente dirigiu-se à imagem de Jesus
crucificado ajoelhando-se no chão de pedra frio, pousou a lamparina
junto a si e entrelaçando os dedos das duas mãos, colocou-as um pouco
acima da sua cabeça, baixou-se em suplica, dizendo baixinho:
- Perdoa-me Senhor porque pequei.
Passou
longos minutos a repetir ladainhas e a deixar as lágrimas escorrerem
livremente pela face, por fim benzeu-se perante a imagem, pegou na
lamparina e continuou o seu plano.
Voltou ao refeitório pelo mesmo caminho, mas desta vez dirigiu-se à porta que dava acesso ao pátio, parou.
A partir deste momento não teria grande controlo sobre o barulho e podia alertar alguém, assim, tinha de ser rápida.
Abriu
a porta para o exterior sentido de imediato o ar frio da neve, fechou a
porta devagar atrás de si e dirigiu-se às cavalariças, ao entrar passou
carinhosamente a mão no cavalo do Monsenhor que se encontrava no
convento a recuperar de uma enfermidade, continuando em direcção às
traseiras onde tinha escondido o que pretendia, desviou com esforço
alguns fardos de palha e lá estava a roupa de homem que conseguira
reunir nas últimas semanas.
Despiu-se num ápice, vestindo aquelas
peças e para não perder tempo não se coibiu de deixar o hábito
espalhado ali mesmo, de seguida selou o cavalo e por fim colocou um
lenço a proteger o nariz e a boca do frio.
Acariciou o seu ventre
que ainda não apresentava alterações, e de queixo tremulo de emoção
ainda concluiu em pensamento que nenhum pecado, dificuldade, ou
probabilidade de morrer à fome escorraçada pela sociedade, a iria
impedir de tentar criar o ser que vinha a caminho!
Levou a mão ao
bolso interno do casaco confirmando que tinha o crucifixo, benzeu-se e
sem pudores, montou o cavalo à homem (ainda se lembrava de quando era
Maria rapaz em pequena), olhou de relance para as vestes do que tinha
sido e não era mais, desatando a galope em direcção a um destino
inserto, mas por certo longe.
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